terça-feira, 10 de maio de 2011

Cenas de autocarro


Fico doente quando vejo um pensionista a criticar um jovem só porque sim, porque é jovem, porque não tem ainda a experiência de vida que o referido senhor. Quando há motivos, pois sim. Mas quando não, quem está a ser desrespeitador e mal-educado é precisamente quem acusa.
As pessoas mais velhas têm a mania que os lugares da frente de um autocarro lhes são exclusivos, quando apenas quatro são de cedência obrigatória. Todos os outros poderão ser "deles" no caso de alguém lhos oferecer voluntariamente. Dito isto, que legitimidade têm eles para apontar o dedo a quem não lhes cede o lugar nos outros locais que não nos tais quatro bancos? Se estivessem caladinhos em vez de acusar, talvez fosse mais fácil que alguém se levantasse realmente de forma voluntária e oferecesse o seu lugar. Sim, porque eu acredito que muita boa gente levanta o rabinho só para não ter de ouvir as queixas e o "Isto agora..." e o "No meu tempo não era assim", e não porque realmente o queira.
Recordo-me de um episódio há uns anos quando ia num daqueles tais lugares de cedência obrigatória. Todos os velhotes que passavam me criticavam, mas nenhum de forma directa; em vez disso, eram muito mais inteligentes e comentavam alto para a pessoa ao lado, assegurando-se de que eu ouvia bem o queixume e a crítica. Calaram-se quando eu me levantei a coxear de tal maneira, que nem apoiava o pé no chão. Alguém pediu desculpa? Alguém se retractou? Qual quê! Há que manter o orgulho de se ser velho, de se ter experiência de vida e de, por isso, ter sempre o dom da razão inquestionável. Valeu eu não ter papas na língua e ter dito "Estes lugares são de cedência obrigatória a pessoas grávidas, com crianças e de mobilidade reduzida. Os senhores estão desde há meia hora cheios de energia a criticar quem tem direito a estar aqui. Não me parece que seja eu a estar no lugar errado." E pronto, silêncio. Tenho a certeza que, mal saí, fui acusada de ser mal-educada por ter dito o que era justo ser dito.
Hoje, uma situação idêntica com um casal jovem de namorados. Estavam sentados naqueles espaços para colocar os sacos (nem em lugares sentados iam) e uma equipa de velhotes começou a criticá-los só porque sim. Não estavam a estorvar, não estavam em cenas impróprias, nada. Iam tranquilos, sem falar ou incomodar alguém. E a velhada toda a criticar e a dizer o mesmo de sempre. Para além de que uma velhota ainda disse que a moça era muito gorda para estar ali, que devia estar era na SIC! Fiquei parva e sobretudo indignada com a ausência de qualquer reação por parte da rapariga. Se fosse eu, não me ficava. Não suporto a mania que os mais velhos têm de que são eles o símbolo do respeito e da boa conduta e os jovens umas bestas quadradas que, só por existirem, já vão destruir o mundo.
Enfim, é ignorar, respirar fundo e seguir em frente.


1 comentário:

Anónimo disse...

Eu cá, por um lado, acho que ela fez muito bem em ignorar. Aposto que o autocarro todo ficou a achar que a "velha" foi mal educada e que a rapariga esteve bem acima do nível dela. Às vezes é o melhor que se pode ou se tem a fazer. Primeiro, porque não ia adiantar de nada estar a responder à "velha", até porque essa ia sempre achar que tem razão e que ainda por cima lhe estavam a faltar ao respeito ao estarem a responder-lhe, ou seja, ia ser colaborar para o joguinho de "vítima" que alguns idosos fazem; segundo, porque às vezes admito que irrita mais quando nos ignoram e deve ter sido isso que a irritou ao ponto de esta dizer que a rapariga devia estar na SIC. Enfim, o que a rapariga deve ter pensado é que só lhe restam mais uns anitos de vida e ainda menos de saúde física e mental.
K